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Como preservar o equilíbrio econômico-financeiro em contratos administrativos

Reequilíbrio econômico financeiro do contrato administrativo - José Rubens Costa Consultoria Jurídica e Advocacia

Contratos administrativos são ajustes firmados entre a Administração Pública (órgãos ou entidades governamentais) e particulares ou entes privados, regidos predominantemente pelas normas de direito público.

Eles têm por objeto a concretização de fins de interesse público, diferindo dos contratos privados comuns em virtude do regime jurídico especial a que se submetem e das prerrogativas de que dispõe a Administração.

Os contratos administrativos podem ser alterados nas hipóteses previstas no art. 124 da Lei 14.133/2021 e essas alterações podem ser unilaterais, quando feitas pela Administração sem a necessidade de prévia anuência do contratado, ou consensuais, por acordo entre as partes.

O equilíbrio econômico-financeiro contratual é, portanto, um princípio fundamental dos contratos administrativos, que garante que as condições originais acordadas entre a Administração Pública e o contratado sejam mantidas ao longo da execução do contrato.

Neste artigo, explicaremos o que é o equilíbrio econômico-financeiro, assim como quais os motivos que fazem um contrato se desequilibrar, como é feito o pedido de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo e alguns exemplos práticos.

 

O que é o equilíbrio econômico-financeiro contratual?

O equilíbrio econômico-financeiro contratual tem previsão na Constituição, especificamente no art. 37, inciso XXI, que estabelece que nas contratações públicas deve-se garantir as “condições efetivas da proposta” do licitante vencedor.

Além disso, a nova Lei de Licitações (Lei 14.133/2021) prevê a necessidade de manutenção do equilíbrio contratual e detalha os mecanismos de recomposição financeira em casos de desequilíbrio, especialmente nos artigos 124 e 131.

Esse equilíbrio é essencial porque os contratos administrativos, diferentemente dos contratos privados, podem ser impactados por alterações unilaterais da Administração, mudanças legislativas e fatores econômicos imprevisíveis, especialmente em modalidades como concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs).

Isso significa que a relação entre encargos assumidos pelo contratado e a remuneração pactuada deve permanecer justa e equilibrada durante toda a vigência do contrato.

Assim, o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo é um direito do contratado quando ocorre uma modificação significativa nas condições do contrato que o prejudique de forma injusta.

É importante destacar, também, que o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo não se aplica a variações normais de mercado ou riscos previsíveis inerentes ao negócio. Sua aplicação é destinada a situações excepcionais que afetam significativamente a execução do contrato, como eventos de força maior, caso fortuito ou ações governamentais que impactem diretamente as condições contratuais.

A aplicação do reequilíbrio-financeiro em contratos públicos deve ser fundamentada e comprovada, demonstrando-se a ocorrência de eventos que justifiquem a revisão contratual para restabelecer as condições inicialmente pactuadas.

 

Causas do desequilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos

O inciso II do art. 124 da Lei 14.133/2021 estabelece hipóteses de alteração do contrato que só podem ser realizadas por acordo entre as partes, a saber:

  • Substituição da garantia de execução quando for conveniente;
  • Mudança no regime de execução ou no fornecimento de bens/serviços devido à impossibilidade técnica de cumprir os termos originais;
  • Alteração na forma de pagamento por circunstâncias supervenientes, sem antecipação indevida; e
  • Reequilíbrio econômico-financeiro do contrato em situações de força maior, caso fortuito, fato do príncipe ou eventos imprevisíveis, desde que respeitada a repartição de riscos prevista no contrato.

A quarta hipótese refere-se à alteração para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato. Isso consiste em manter uma relação estável entre os custos e encargos do contratado e a remuneração pela Administração em contrapartida ao fornecimento do bem, execução de obra ou prestação de serviço.

O desequilíbrio econômico-financeiro em contratos administrativos pode ser causado por diversos fatores que alteram a equação inicialmente estabelecida entre as partes.

Se houver um rompimento dessa equação, a legislação prevê mecanismos para restabelecer a justiça contratual, assegurando a continuidade da prestação do serviço sem comprometer a viabilidade econômica do contrato. Destacamos a seguir as principais causas de desequilíbrio contratual reconhecidas pela doutrina e pela legislação.

 

Alterações contratuais unilaterais pela Administração (álea administrativa)

A Administração Pública detém, por lei, a prerrogativa de modificar unilateralmente contratos administrativos em certos aspectos, visando melhor adequação ao interesse público (conforme prevê, por exemplo, o art. 124, I, da Lei 14.133/2021). Tais alterações podem podem ser: 

  • Acréscimos ou supressões do objeto contratual (até certos limites percentuais); ou
  • Mudanças técnicas no projeto.

Quando a Administração exerce esse poder de alteração, deve assegurar que o equilíbrio original seja mantido, ajustando a equação econômico-financeira se necessário.

Caso a modificação imponha encargos adicionais ao contratado ou reduza significativamente as vantagens previstas, sem a devida compensação, haverá desequilíbrio contratual. Para ilustrar, veja alguns exemplos:

Exemplo: a Administração decide ampliar em 20% o volume de obras contratado ou alterar especificações do projeto que encarecem a execução; o contratado passa a ter custos maiores que os previstos inicialmente, cabendo recomposição do valor pago para restabelecer a equivalência.

Por outro lado, se a Administração suprime parte do objeto (diminui quantitativos), o contratado pode ter investido em estrutura para o contrato que não será amortizada – também aí surge direito a reequilíbrio (indenização pela parte suprimida).

A legislação já presume o dever de indenizar ou ajustar o contrato nesses casos, exatamente para preservar a condição original de equilíbrio econômico.

 

Fato da Administração

Fatos da Administração são condutas, omissões ou atrasos imputáveis à própria Administração contratante que acabam por onerar o contrato.

Diferem-se das alterações unilaterais (que são lícitas e formais) porque aqui geralmente se trata de descumprimento contratual ou comportamento irregular da Administração. Alguns exemplos de fatos da Administração:

  • Demora na entrega do local da obra, inclusive atrasos na desapropriação e desocupação;
  • Demora na liberação de licenças de responsabilidade do órgão público, por circunstâncias alheias ao contratado;
  • Interferências administrativas que retardam o cronograma;
  • Alterações informais de projeto ou ordens de serviço conflitantes; e
  • Deixar de realizar os pagamentos devidos ao contratado (inadimplência).

Esses fatos geram custos extras ou prejuízos ao contratado (equipamentos e equipe ociosos, necessidade de retrabalho, etc.), rompendo a equivalência inicial.

Configurado o inadimplemento da Administração ou comportamento causador de aumento de encargos, o contratado faz jus ao reequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo, na forma de indenização ou prorrogação de prazos, restituindo-lhe o custo adicional incorrido.

O ente público não pode se beneficiar de sua própria falha; ao contrário, deve reparar o impacto econômico causado ao particular.

 

Fato do príncipe

Fato do príncipe se trata de ato geral da Administração Pública (em sentido amplo, abrangendo União, Estados ou Municípios e os poderes públicos) que, sem se dirigir especificamente ao contrato, acaba por atingi-lo indiretamente, criando obrigações ou custos não previstos e alterando o cenário econômico ou jurídico do contrato.

Alguns exemplos clássicos de fatos do príncipe:

  • Criação ou aumento de um tributo que incide sobre a atividade contratada (por exemplo, instituir um novo imposto, elevar alíquotas de ICMS, ISS, etc.);
  • Mudanças legislativas ou regulatórias que imponham novos padrões ou exigências ao objeto do contrato (como uma lei ambiental mais rigorosa que obrigue adoção de tecnologias não previstas originalmente); e
  • Fixação de salário mínimo ou piso salarial por lei em patamar muito acima do previsto na época da licitação, onerando contratos de prestação de serviços com mão de obra intensiva.

Pelo princípio do fato do príncipe, o contratado não deve suportar sozinho os custos de medidas estatais supervenientes, imprevisíveis ao tempo da contratação, e tem direito à recomposição desses prejuízos, já que tais medidas fogem da sua alçada de controle.

 

Álea econômica extraordinária (caso fortuito ou força maior)

São as circunstâncias imprevisíveis ou, se previsíveis, de efeitos incalculáveis, de natureza externa às partes, que impactam drasticamente a execução do contrato​.

Enquadram-se aqui os eventos de força maior ou caso fortuito, tais como desastres naturais (enchentes, terremotos), crises econômicas abruptas, guerras, epidemias ou outras calamidades.

Esses eventos podem tornar a execução muito mais onerosa ou até inviabilizar temporariamente o cumprimento do contrato, sem que nenhuma das partes tenha dado causa.

Um exemplo real de álea econômica extraordinária foi a pandemia de Covid-19 em 2020 e 2021, quando as medidas de lockdown e a drástica redução de atividades econômicas impactaram diversos contratos públicos. Concessionárias de transportes públicos viram sua receita tarifária despencar em razão das restrições de circulação, do home office e aulas a distância (EAD), levando a um sério desequilíbrio financeiro​.

Segundo boletim sobre os “Impactos da Covid-19 no Transporte Público por Ônibus” da NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos) da época, houve um prejuízo real acumulado de R$9,5 bilhões pelas operadoras em 2020. Para tentar reduzir os prejuízos, o poder público adotou algumas medidas, como subsídios de tarifas, desoneração tributária e compras antecipadas de créditos eletrônicos.

Mas ainda assim, o Poder Judiciário reconheceu a necessidade de reequilibrar os contratos em muitos casos. Por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu, em decisão emergencial relativa ao município de de Araruama (RJ), que a queda abrupta de demanda causada pela pandemia justificava a aplicação do reequilíbrio econômico financeiro de contratos administrativos em favor das concessionárias, dada a alteração imprevisível das condições do contrato​.

Outros exemplos de força maior que podem ensejar revisão contratual para recompor perdas excepcionais são:

Contudo, distinguir o que é risco normal (do empresário) do que é risco extraordinário (que autoriza reequilíbrio) é fundamental na análise de cada caso concreto. A legislação e os contratos normalmente já contemplam mecanismos para lidar com a álea econômica ordinária, principalmente por meio do reajuste anual de preços.

Somente quando uma variação econômica extrapola o patamar ordinário e adquire contornos de excepcionalidade (como inflação muito acima do previsto, ou alta de custos muito concentrada e fora do padrão) é que se transborda para a categoria de desequilíbrio extraordinário.

 

LEIA TAMBÉM: Como funciona o consórcio de empresas em licitações públicas: requisitos, vantagens e pontos de atenção

 

Mecanismos de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo

O reequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo é a recomposição das condições efetivas da proposta vigentes no momento da contratação​.

A finalidade do reequilíbrio financeiro em contratos públicos é assegurar que o contratado não sofra prejuízo indevido nem aufira vantagem indevida em relação ao pactuado inicialmente – mantendo-se a justiça contratual e viabilizando a continuidade da execução nos termos ajustados.

Trata-se de um dever da Administração previsto em lei e decorrente da Constituição, que visa proteger tanto o interesse do particular (de não executar o contrato em perda) quanto, em última análise, o próprio interesse público na conclusão do objeto contratual sem interrupções ou diminuição de qualidade.

O ordenamento jurídico brasileiro prevê diferentes instrumentos para promover o reequilíbrio de contratos administrativos, conforme a natureza e a causa do desequilíbrio contratual, sendo os principais:

  • Reajuste;
  • Repactuação; e
  • Revisão ou recomposição de preços (também chamada simplesmente de reequilíbrio contratual).

O reajuste e a repactuação cuidam da manutenção periódica frente a variações esperadas, enquanto a revisão (ou recomposição) atende a situações excepcionais não cobertas pelos mecanismos anteriores.

Esses instrumentos não se excluem mutuamente – ao contrário, podem coexistir. Cada instituto tem pressupostos próprios e o importante é aplicar o mais adequado à causa do desequilíbrio, de modo a efetivamente recompor a equação original​. Veja detalhes de cada mecanismo a seguir.

 

Reajuste em sentido estrito

O reajuste em sentido estrito aplica-se em contratos de execução continuada ou prolongada e normalmente está previsto para ocorrer depois de certo intervalo de tempo, geralmente anual. É a forma de atualização periódica do valor contratual para acompanhar a variação ordinária dos preços na economia, notadamente a inflação.

A Constituição, ao garantir a manutenção das condições da proposta, levou o legislador a tornar obrigatório que contratos de duração superior a doze meses prevejam critérios de reajuste​.

Assim, tanto a antiga Lei 8.666/1993 quanto a Lei 14.133/2021 determinam a inclusão de uma cláusula de reajuste ou atualização de preços. Em regra, utiliza-se um índice setorial ou geral de preços, previamente fixado no edital e no contrato, que incidirá sobre o preço original para corrigir a perda do poder de compra da moeda​.

Por exemplo, contratos de construção podem ser reajustados pelo Índice Nacional de Custos da Construção (INCC); contratos de serviços de limpeza, por um índice de inflação como IPCA ou IGPM, e assim por diante. O objetivo do reajuste é cobrir a álea econômica ordinária, ou seja, a elevação normal e previsível dos custos de produção ao longo do tempo​.

Cabe frisar que a legislação veda reajustes em intervalos menores que um ano – a Lei 10.192/2001, art. 3º, §1º, estabelece periodicidade mínima anual para ajustes de preço, de modo a evitar reajustes muito frequentes e alinhar com as políticas anti-inflacionárias​.

Desse modo, o reajuste anual por índice é obrigatório e automático (quando previsto contratualmente), não configurando exatamente um “pedido de reequilíbrio”, mas sim uma execução contratual normal para manter o equilíbrio frente à inflação esperada.

Para concessão de reajuste, o marco inicial conta-se da data do orçamento estimado a que a proposta se refere (estimativa realizada pela Administração), conforme previsto no edital e no contrato, ou, ainda, do último reajustamento.

 

Preclusão lógica do direito ao reajuste

A preclusão lógica do direito ocorre quando uma parte pratica um ato incompatível com o exercício de um direito posterior, levando à perda da possibilidade de exercê-lo. Em outras palavras, trata-se da impossibilidade de reivindicar um direito porque a própria parte adotou uma conduta que contradiz essa pretensão.

A Advocacia-Geral da União (AGU) entende que, em regra, o direito ao reajuste contratual não está sujeito à preclusão lógica, pois a sua concessão ocorre automaticamente pela Administração Pública, sem necessidade de requerimento do contratado. Diferente da repactuação, que exige solicitação e comprovação de aumento de custos, o reajuste pode ser aplicado diretamente com base no índice previsto no contrato.

Entretanto, há exceção nos casos em que o edital e o contrato determinam que o reajuste depende de requerimento prévio do contratado. Se o contratado não solicitar o reajuste no prazo adequado e aceitar a prorrogação do contrato sem qualquer ressalva, pode ser considerada renúncia tácita ou preclusão lógica do direito ao reajuste. Para que isso ocorra, é necessário que:

  • O edital e o contrato prevejam expressamente essa necessidade;
  • O contratado não apresente o pedido antes da prorrogação; e
  • O aditivo seja assinado sem ressalva sobre o reajuste.

O Conselho da Justiça Federal (CJF) também se manifestou sobre o tema em 2022, no enunciado 6 aprovado no 1º Simpósio de Licitações e Contratos da Justiça Federal, afirmando que não há preclusão lógica do direito ao reajuste, mas que o pedido deve ser feito pelo contratado, não cabendo à Administração concedê-lo de ofício. Já o Tribunal de Contas da União (TCU) tem precedentes (1 e 2) indicando que a Administração deve conceder o reajuste automaticamente

No entanto, destacamos que ainda não há jurisprudência consolidada sobre a preclusão nesse contexto; mesmo com a Lei 14.133/2021, o tema permanece controverso e aguarda posicionamento definitivo dos tribunais.

Portanto, se uma empresa possui contrato com a Administração Pública, o ideal é sempre se precaver e realizar o pedido de reajuste anualmente. E, caso tenha deixado passar, realizá-lo o quanto antes, além de contar com o apoio de um escritório de advocacia especializado em Direito Administrativo para orientação e realização do pedido judicialmente, quando necessário.

 

Repactuação

A repactuação é um mecanismo específico, aplicado principalmente a contratos de prestação de serviços continuados com dedicação exclusiva de mão de obra, muito comuns na Administração (como vigilância, limpeza, serviços terceirizados em geral).

Ela consiste em reajustar o valor do contrato com base na variação efetiva de cada componente de custo, em especial custos trabalhistas, e deve obedecer ao intervalo mínimo de um ano após o início do contrato ou a última repactuação (geralmente coincidindo com datas-base de dissídios coletivos ou acordos salariais da categoria).

Diferentemente do reajuste por índice (que é uma correção global, percentual), a repactuação exige a demonstração analítica das variações de custos ocorridas, reavaliando item a item da planilha contratual​.

A finalidade da repactuação é adequar o preço do contrato ao preço de mercado atualizado, considerando os aumentos salariais concedidos por dissídios ou convenção coletiva, variação de insumos específicos etc., desde que referentes a contratos cuja principal variável de custo é a mão de obra.

Importante destacar que não se admite repactuação para contratos que não envolvam mão de obra vinculada ou em contratos de obra e fornecimento pontual​ – nesses, eventual desequilíbrio deve ser tratado via reajuste por índice ou revisão extraordinária.

O pedido de repactuação deve ser formulado antes de eventual prorrogação. Na hipótese de o contratado aceitar prorrogar o contrato sem pleitear a repactuação, ocorrerá a preclusão lógica do seu direito, e as condições econômicas da prorrogação serão mantidas.

 

Reequilíbrio econômico-financeiro (recomposição ou revisão)

O reequilíbrio econômico-financeiro é o instrumento destinado a recompor a equação econômico-financeira quando ocorre um fato excepcional, imprevisível ou inevitável que provoca desequilíbrio durante a execução do contrato.

Diferentemente do reajuste e da repactuação (que cobrem variações ordinárias e previsíveis ao longo do tempo), a revisão objetiva enfrentar situações extraordinárias, enquadradas na álea extraordinária e extracontratual, como vimos anteriormente.

Prevista desde a Lei 8.666/1993 (art. 65, II, “d” e §5º) e refletida na nova Lei 14.133/2021 (art. 124, inciso II, alínea “d”), a revisão é cabível​​, por acordo entre as partes, para restaurar o equilíbrio inicial em caso de eventos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, bem como em caso de força maior, caso fortuito ou atos estatais (fato do príncipe) que tornem inviável a execução nos moldes originais.

Assim, a revisão, ou recomposição, pode ser entendida como sinônimo de reequilíbrio econômico-financeiro em sentido estrito. Veja alguns exemplos: 

  • Concessão de reajuste extraordinário de preços unitários devido a uma alta abrupta e imprevisível do dólar (afetando um insumo importado essencial);
  • Acréscimo no prazo e pagamento de indenização ao contratado pela paralisação de obra causada por descoberta arqueológica inesperada no canteiro (caso fortuito);
  • Reequilíbrio de contrato de alimentação escolar após uma epidemia reduzir a oferta de determinados alimentos, elevando seus preços muito acima da inflação.

A revisão, portanto, não tem período fixo para ocorrer – pode ser pleiteada a qualquer tempo durante a vigência contratual assim que se verificar o evento desequilibrante​. Em qualquer caso, o fato causador do desequilíbrio do contrato administrativo deve ser superveniente à data de apresentação da proposta

A extinção do contrato também não impede o reconhecimento de desequilíbrio econômico-financeiro. Nesse caso, será concedida indenização por meio de termo indenizatório.

Diferentemente do reajuste, que é objetivamente previsto no contrato, a recomposição depende de provocação (pedido) do interessado e análise concreta pela Administração, mediante comprovação do desequilíbrio e do nexo causal com o fato alegado​. Em contratos de prestação continuada, essa solicitação deve ser feita antes de eventual prorrogação.

Além disso, deve ser respeitada a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato por meio da matriz de riscos. Assim, na ocorrência de evento superveniente alocado na matriz de riscos como de responsabilidade do contratado, este deverá assumir os prejuízos decorrentes do sinistro e não poderá pleitear o reequilíbrio econômico financeiro de contratos administrativos.

Vale salientar que a revisão pode implicar aumento ou redução do valor contratual​ – embora na prática seja mais comum o aumento pleiteado pelo contratado, também se admite reduzir preços em favor da Administração se um evento superveniente reduzir significativamente os custos (por exemplo, desoneração tributária inesperada sobre o objeto, barateando a execução).

Questões de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo podem ser complexas e pode acontecer das partes não chegarem a um acordo administrativamente. Nestes casos, é possível contar com outros mecanismos de resolução de conflitos, como conciliação, mediação e arbitragem (expressamente previstos na Lei 14.133/2021, art. 151, parágrafo único) – quando é recomendável contar com um apoio jurídico especializado.

 

Reequilíbrio cautelar (ou liminar)

Diante da morosidade dos processos administrativos de reequilíbrio econômico-financeiro, existe a necessidade de compatibilizar a garantia do equilíbrio contratual com a razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, da Constituição).

Uma solução para isso é a previsão do reequilíbrio cautelar, inspirado em medidas cautelares e liminares previstas no Código de Processo Civil (art. 294 a 299). Assim, permite-se a antecipação provisória de medidas de recomposição financeira, enquanto avalia-se o montante exato a ser compensado a título de reequilíbrio econômico-financeiro no processo definitivo, garantindo a continuidade da prestação dos serviços públicos.

Um exemplo real e pioneiro deste tipo de mecanismo de reequilíbrio é o da Secretaria de Parcerias em Investimentos do Estado de São Paulo, a partir da Resolução SPI nº 19/2023, que estabeleceu os procedimentos e critérios para a aplicação do reequilíbrio cautelar em contratos de concessão com o Estado de São Paulo.

 

Como solicitar o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo

Quando o contratado identificar que ocorreu um evento causador de desequilíbrio econômico-financeiro no contrato administrativo, deve formalizar um pedido de reequilíbrio junto à Administração contratante, conforme o procedimento detalhado a seguir.

 

Comunicação formal e tempestiva

O contratado deve notificar a Administração assim que constatar o fato gerador do desequilíbrio contratual, indicando claramente o ocorrido e os impactos no contrato.

A solicitação normalmente é feita por requerimento escrito, dirigido à autoridade competente (gestor ou fiscal do contrato, ou diretamente à comissão designada para análise de reequilíbrio, se houver).

A nova Lei 14.133/2021 estabelece que o pedido de restabelecimento do equilíbrio deve ser formulado durante a vigência do contrato e antes de eventual prorrogação dele​. Ou seja, não se deve aguardar o término do contrato para pleitear a recomposição.

Contudo, a mesma lei previu uma inovação: a extinção do contrato não impede o reconhecimento do desequilíbrio ocorrido, caso ele seja comprovado, fazendo jus o contratado a uma indenização específica (por meio de “termo indenizatório”) após o fim do contrato​.

Essa regra do art. 131 da Lei 14.133/2021 veio para dar segurança de que o direito ao reequilíbrio não se perde automaticamente com o fim do prazo contratual – embora enfatize a necessidade de pleiteá-lo dentro da vigência do contrato, por uma questão de boa-fé e controle administrativo.

 

Justificativa e comprovação

Junto com o pedido, o contratado deve apresentar documentação detalhada que comprove o alegado desequilíbrio no contrato administrativo. Isso inclui, conforme o caso:

  • Planilhas comparativas de custo antes e depois do evento;
  • Notas fiscais de insumos mostrando a variação de preços;
  • Índices oficiais (inflacionários, cambiais) pertinentes;
  • Estudos de impacto financeiro;
  • Cópia de novas leis/regulamentações se for fato do príncipe; e
  • Laudos ou registros de ocorrência de força maior (por exemplo, ata meteorológica de enchente, decreto de calamidade pública, etc.).

Enfim, é preciso demonstrar de modo objetivo o aumento de custos ou redução de receitas e seu vínculo com o evento imprevisível ou ato estatal em questão.

A orientação do TCU e da AGU é de que cada item de custo afetado seja evidenciado, quantificando-se o impacto, de modo a delimitar com precisão o montante do reequilíbrio devido​. Não basta alegar dificuldade financeira genérica; é necessário provar a ruptura da equação econômico-financeira de forma concreta e específica.

 

Análise pela Administração

Após receber o pedido, a Administração instaura um procedimento administrativo para avaliação. Verifica-se a legalidade do pedido, e comissões especializadas podem ser acionadas devido à complexidade do tema. Pode haver negociação entre as partes se houver divergência nos valores pleiteados.

A autoridade administrativa competente, então, decide sobre o pedido, podendo deferi-lo total ou parcialmente, ou indeferi-lo.

Caso aprovado, formaliza-se um termo aditivo ao contrato, alterando cláusulas como preço e forma de pagamento. O reequilíbrio também pode ocorrer por prorrogação de prazos ou ajustes no cronograma. Se o contrato já tiver sido encerrado, o reequilíbrio pode ser concedido por meio de um termo indenizatório, reconhecendo e garantindo o pagamento ao contratado.

Caso o pedido seja negado ou concedido de forma insatisfatória, o contratado pode recorrer administrativamente ou ajuizar ação judicial. O Poder Judiciário pode reconhecer o direito ao reequilíbrio e determinar indenização ao contratado, uma vez que o equilíbrio econômico-financeiro é um princípio constitucional e legal.

 

Conclusão

O equilíbrio econômico-financeiro é um pilar dos contratos administrativos, previsto na Constituição e na legislação sobre licitações, refletindo o compromisso com a justiça e a estabilidade nas contratações públicas.

Assim, a garantia do reequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo pela aplicação adequada dos mecanismos legais de recomposição é fundamental para garantir a continuidade e a eficiência dos serviços públicos.

Portanto, é imperativo que tanto gestores públicos quanto contratados estejam atentos às disposições legais e contratuais, promovendo uma gestão proativa e transparente que resguarde os interesses públicos e privados envolvidos.

Se você tem dúvidas sobre equilíbrio econômico-financeiro de contratos administrativos e licitações, e quer fazer bons negócios com a Administração Pública, entre em contato conosco!

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